Existem momentos na vida em que você já atingiu estabilidade profissional, por ter vivido diferentes experiências, colhido resultados expressivos ou nem tanto, mas que um sentimento de inquietude lhe toma a mente, e você sabe que é possível conseguir “algo a mais”, que pode lhe tirar da zona de conforto e lhe levar a outro patamar em sua carreira. É neste estado que me encontrava em março de 2010. Na época, entrando no quarto e último ano de minha função como coordenador de graduação em engenharia na UFSC, instituição onde leciono, há 20 anos. Naquele momento, percebi que apesar de já ter atingido situação bem confortável, vislumbrei a possibilidade de realizar um pós-doutorado no exterior. Não sabia que estava iniciando nova fase na vida, que me levaria a outra fronteira do conhecimento.
Compartilho brevemente com você esta trajetória, tentando pincelar as partes mais importantes.
Como ponto de partida, esta é a visão que estabeleci. Por já ter morado no exterior duas vezes, Japão (devido à especialização) e Inglaterra (onde fiz parte do doutorado), tomei quatro decisões: O pós-doutorado teria que ser nos Estados Unidos, pois além do aprendizado científico, queria vivenciar o ambiente multicultural da sociedade americana; A pesquisa teria que ser envolvendo Inteligência Artificial, e não outra área em que também atuo; O trabalho teria que ser numa instituição de referência, o que limitou as universidades com que entraria em contato; E teria que iniciar em fevereiro de 2011, por questões de calendário acadêmico. Em função do currículo, acreditava que poderia ser aceito por instituições de renome mundial e tinha em mente como “melhor dos mundos” a Universidade de Stanford. Esta visão implicava numa atitude de estar disposto a arriscar e se confrontar com sentimentos como frustração, desaprovação, ou algo equivalente.
Com base nesta visão, e considerando o curto prazo para submissão do projeto, até final do primeiro semestre, para pleitear recursos, coloquei o plano em ação. De início, apliquei estratégia meio padrão, elaborando mensagem típica apresentando meu currículo, e enviando-a aos pesquisadores das melhores universidades americanas. Desta estratégia, tive retorno de uma professora de Carnegie Mellon, que me conhecia, mas naquela época ela me referenciou a outros professores, e vi que não teria condições de estabelecer um projeto de comum interesse. Além disto, recebi vários “nãos” e muitos pesquisadores sequer respondiam minhas solicitações.
Descobri que a NASA oferecia bolsas de pós-doutorado. Embora não estivesse buscando bolsa, pois acreditava que poderia obter recurso do Brasil, considerei a possibilidade de contatar alguns de seus pesquisadores. Inicialmente, aplicando a mesma estratégia, portanto colhi os mesmos resultados, ou seja nenhum contato de interesse. Foi então que encontrei um artigo publicado por dois pesquisadores em uma conferência. Costumo dizer nas palestras que este foi o momento “Game Change”, pois o jogo realmente mudou. Estudei cuidadosamente aquela referência, fazendo uma análise com cinco perguntas e minhas respostas. Depois desta análise, mantive contato com a pesquisadora líder, que em pouco tempo me enviou mensagem perguntando “se eu queria mesmo pesquisar na NASA”.
Apesar da excelente interação, havia um detalhe, ela era contratada por projetos, e não sabia se teria verba para aquele projeto específico no ano seguinte. Devido a isto, ela não teve condições de me enviar a carta de aceite que seria o documento fundamental para submeter o projeto de pesquisa, e por causa deste impasse, suspendemos o contato. Neste instante, lhe convido à seguinte reflexão: Quais sentimentos passariam em sua mente ao saber que quase chegou lá? Que quase atingiu o seu objetivo? Que quase foi aceito por uma das maiores instituições do mundo?
Quando faço esta reflexão em minhas palestras, as pessoas falam de frustração, desânimo, desestímulo e coisas parecidas.
Pois bem, tive a chance de experimentar uma outra qualidade fundamental, resiliência! Decidi procurar outro pesquisador na NASA que tivesse interesse em me receber. E acabei conseguindo, por coincidência no mesmo centro de pesquisa. Desta vez, apliquei a estratégia bem sucedida e em tempo hábil consegui a tal carta de aceite. Resumindo, iniciei o pós-doc em 14 de fevereiro de 2011, no centro NASA Ames, em Mountain View, coração do Vale do Silício, onde morei exatamente um ano. Tive a oportunidade de trabalhar num grupo multicultural, como havia idealizado na visão, conhecer uma organização muito complexa, que tem como um dos parâmetros de avaliação alto rigor em suas publicações científicas. Sobre isto, publiquei três artigos com seis pesquisadores de quatro países. Sendo uma delas, a pesquisadora que foi o contato inicial.
Um detalhe interessante foi que, poucos meses antes da viagem, o professor de Stanford me escreveu dizendo que meu e-mail havia sido perdido, e se ainda eu quisesse realizar pós-doc com seu grupo, poderia responde-lo. O que fiz para lhe agradecer e mencionar que tinha sido aceito pelo NASA Ames e iria morar na cidade vizinha a Palo Alto.
Quando do início mencionei que esta jornada me levou a outra fronteira é porque, voltando ao Brasil, surgiram convites para compartilhar esta trajetória na forma de palestras motivacionais, o que tenho feito descrevendo em mais detalhes os percalços e as qualidades não técnicas como humildade intelectual, trabalho em diversidade, paciência, persistência, entre outras. Hoje, além de professor, compartilho esta jornada motivando jovens e profissionais, em geral, na busca por níveis mais plenos de satisfação pessoal e profissional!
Na próxima vez que você estiver diante de um sentimento de inquietude com sua carreira profissional, pense grande e você poderá atingir resultados muito além do imaginado!
Sucesso!